Moraes despachou de Paris, Dino almoçava com família; saiba como foi o 8/1 de um ano atrás das autoridades

Manifestantes invadem Congresso, STF e Palácio do Planalto.

Os ataques aos edifícios dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023 pegaram diversas autoridades de surpresa.

Como se tratava de um domingo, boa parte das principais autoridades do Supremo Tribunal Federal (STF), do Congresso e mesmo do governo estavam de folga, em atividades corriqueiras. Muitos estavam fora de Brasília.

A ministra Rosa Weber, então presidente do Supremo, era a única chefe de Poder na capital federal naquele dia.

O presidente Lula (PT) havia acabado de chegar a Araraquara (SP) para cumprir uma agenda de visita a locais afetados pelas fortes chuvas que atingiram a cidade em dezembro de 2022.

Alexandre de Moraes, ministro do STF

Relator no STF dos inquéritos relacionados ao 8/1, o ministro estava com a família em Paris para uma semana de folga.

“Tinha chegado dia 6. Estava com a minha família no hotel, era em torno de 18h de lá. Nós vimos, primeiro pelas redes sociais, imediatamente já começamos a ver as TVs brasileiras pelo celular, e nisso eu liguei para o ministro Flávio Dino [Justiça], perguntando o que tinha ocorrido”, disse Moraes.

O ministro relata que o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, ligou para ele e fez relatórios do que havia ocorrido.

“Em que pese estarmos no recesso, eu não entro em recesso, continuo despachando normalmente, principalmente os casos mais urgentes. Eu passei a madrugada trabalhando, a minha última decisão é de 0h20, mais ou menos, que seja 4h20 lá, e daí eu já havia comprado uma passagem de retorno para mim. Saí do hotel, fui para o aeroporto e vim direto para o Supremo Tribunal Federal”.

Flávio Dino, ministro da Justiça

Dino estava em almoço com a família em uma região administrativa distante do centro do Distrito Federal quando soube dos ataques.

“Eu estava num bairro, numa cidade satélite de Brasília, numa espécie de almoço familiar. A Lorena [assessora de imprensa] estava aqui [no ministério] com espírito de jornalista e me liga, 14h e alguma coisa, 14h20, e informa que eles [manifestantes] estavam rompendo as barreiras”, afirmou.

Dino disse que deixou o almoço naquele momento rumo ao ministério e que, no trajeto de cerca de 40 km, os apoiadores de Bolsonaro romperam outra barreira, mais próxima do Congresso. Do carro, ele disparava telefonemas enquanto sua mulher dirigia.

Chegando ao ministério, Dino criou um gabinete de crise, de onde redigiu o decreto de intervenção no Distrito Federal e ficou até a situação ser controlada.

José Múcio, ministro da Defesa

“Eu estava almoçando num restaurante em Brasília quando me avisaram que o pessoal estava se deslocando de lá [Quartel-General do Exército] para cá [Esplanada]. Saí do restaurante, vim primeiro aqui para o Ministério da Defesa, depois corri para o Ministério da Justiça”, contou o ministro.

Múcio nega que Dino tenha se indisposto com ele, como sugerem imagens do circuito interno do Palácio do Planalto.

“Se você conviver muito comigo, [sabe que] eu não entro numa discussão dessa. Não há hipótese. Ele estava conversando com o Rui [Costa, ministro da Casa Civil], e aquela gesticulação foi fruto da indignação dele. […] Aquele gesto de Dino não tinha absolutamente nada a ver comigo”.

Gilmar Mendes, ministro do STF

“Eu estava em Portugal e almoçava com o professor Nuno Piçarra, juiz da Corte Europeia de Justiça. Estávamos em um restaurante conversando exatamente sobre como tinha sido tranquila a transição de poder no Brasil, quando começaram a chegar as primeiras notícias. Em casa, vi o tamanho da crise, do estrago. Decidi voltar ao Brasil, já não consegui passagem no dia imediato, no dia 9, só consegui no dia 10”, conta o ministro.

“Eu cheguei aqui [a Brasília] e fui logo para o palácio lá nosso, da Justiça [sede do STF]. Tive toda a impressão que foi traduzida na televisão. Chorei, fiquei muito indignado e inconformado com tudo”.

Luís Roberto Barroso, então vice-presidente do STF, hoje presidente

“Eu estava em Brasília, no hospital com a minha mulher, que já estava muito doente, quando eu soube dos acontecimentos e assim que foi possível eu vim para cá”, contou o ministro.

Ele diz que chegou ao STF por volta de 20h e encontrou a ministra Rosa Weber. “Entramos pelas esquadrias, que estavam todas quebradas, e aí vimos aquela cena desoladora, que era uma mistura de detritos, retratos quebrados, cadeiras jogadas, água, Cristo no chão, uma cena de devastação naquele momento. A sensação é indescritível”, disse.

Rodrigo Pacheco, presidente do Senado

O senador estava em Paris e soube dos ataques por uma ligação de Alessandro Morales, chefe do Departamento de Polícia do Senado. “Estava viajando, passeando com a minha família. Obviamente com o telefone, atento não só a esse problema, mas a todos os problemas que a presidência do Senado carrega consigo mesmo nos momentos de folga”.

Pacheco diz que não esperava “jamais” que algo naquele patamar pudesse acontecer. “Eu estava fora do Brasil e com um sentimento de frustração por não poder estar aqui para defender o Poder que eu represento. Então eu confiei à Polícia Legislativa. Mantivemos o diálogo, voltei imediatamente, [peguei] o primeiro voo possível de retorno. Minha família ficou e no dia seguinte eu estava aqui”.

Pacheco afirma que, no voo de volta ao Brasil, viveu “momentos de reflexão, de apreensão [sobre] o que podia estar acontecendo, qual era a gravidade, qual seria a consequência disso”.

Ricardo Cappelli, secretário-executivo do Ministério da Justiça e interventor

“Estava almoçando na Asa Norte [região central de Brasília] com uns amigos, porque minha família estava chegando no dia 9 com a mudança do Maranhão”, contou. “Quando percebi que a coisa estava passando um pouco dos limites, eu saí correndo do restaurante. Passei no hotel, troquei de roupa e me dirigi aqui ao ministério”.

O secretário diz que quando chegou os manifestantes já estavam invadindo o Congresso Nacional.

Andrei Rodrigues, diretor-geral da Polícia Federal

O diretor estava em um churrasco com a mãe, os filhos e outros parentes, que haviam viajado a Brasília para prestigiar sua posse como chefe da PF, marcada para 10 de janeiro. “Infelizmente, não consegui comer nem um pedaço de carne”, lembra.

“Comecei a acompanhar com a nossa atividade de equipe de inteligência, com redes abertas, redes sociais e tudo mais. O que se viu, para o meu espanto naquele momento, foi a Polícia Militar escoltando esses bandidos que não poderiam ter saído de dentro do acampamento”, afirmou.

“Quando vi aquela cena eu logo percebi: olha, isso não vai terminar bem. Tomei banho, botei meu terno e aí, não recordo o horário, mas no começo da tarde, fui para o Ministério da Justiça.”

Geraldo Alckmin, vice-presidente da República

Alckmin estava na zona leste de São Paulo, em uma missão em São Miguel Paulista para a posse de um bispo. Perto do final da missa, um segurança entregou a ele um bilhete dizendo que os prédios públicos estavam sendo invadidos. Alckmin, porém, pensou que poderia haver exagero do auxiliar e ficou até o final da eucaristia. Por volta das 18h, quando saiu, se deu conta da gravidade dos atos. Conversou com Lula pelo telefone e retornou a Brasília.

Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais

Padilha estava em um compromisso familiar quando soube dos ataques. “Domingo era um dia meio que de descanso para todo mundo. Eu estava almoçando e a minha companheira, ela é jornalista, olhou o celular e falou assim: olha, está acontecendo um negócio aqui meio estranho”.

Padilha diz que estava ciente de que haveria manifestação, mas que o monitoramento do ato estava a cargo das equipes do Ministério da Justiça, da Defesa e do governo do Distrito Federal. “Com a informação de que teriam entrado no Congresso, as primeiras pessoas para quem eu ligo foram o presidente [da Câmara] Arthur Lira e o presidente do Senado Rodrigo Pacheco”.

Segundo o ministro, Lira afirmou que estava preocupado de que a estrutura de segurança que caberia ao governo do Distrito Federal não estava lá.

General Júlio César Arruda, então comandante do Exército

Arruda acompanhou tudo de seu gabinete, no Quartel-General do Exército. Foi lá que recebeu, à noite, Rui Costa, Flávio Dino, José Múcio e Ricardo Cappelli. A conversa terminou com o general colocando o dedo na cara do Cappelli. Metade do Alto Comando do Exército estava de férias, fora de Brasília.

Um general contou à Folha, sob reserva, que estava no interior de São Paulo, visitando a família, com sinal de internet instável, quando viu as diversas mensagens no celular sobre os ataques. Correu para voltar para Brasília, assim como os outros chefes militares retornaram para suas respectivas bases.

Paulo Pimenta, secretário de Comunicação da Presidência da República

“Eu estava em casa quando comecei a enxergar aquelas imagens e na hora que ouvi que rompeu aquele cordão que dá acesso ao Congresso, percebi que tinha alguma coisa errada”, lembra Pimenta.

“Nós nos deslocamos para cá [Palácio do Planalto], nós entramos. Não tinha ninguém […]. Tanto que nós subimos e chegamos aqui no segundo andar sem falar com ninguém. Isso por volta das 18h30”, disse.

Folha de S.Paulo

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